sexta-feira, 30 de maio de 2008

O amor: filmes

Falar em filmes românticos... ou não tão românticos assim. Afinal, as paixões não se fazem só de beijos magnifícos e reconciliações... há a dor, o ridículo, o absurdo.

O amor romântico é para os fracos... mas ainda quero conhecer alguém suficientemente forte pra se safar dessa pieguice. Afinal de contas, o que há de comum entre o doutor em Astrofísica e o mané da padaria? Ambos já pensaram em cortar os pulsos no frenesi de uma jura de amor rompida ou dizer para alguma mulher: "sua desgraçada"! O que há de comum entre uma mulher superexperiente pós grad
uada em relacionamentos e com vida profissional de sucesso e uma ninfeta de 12 anos que bate o o pé para ir à escola? Ambas ficam eufóricas quando recebem uma mensagem de seu pretendente no celular, ou não desgrudam do maldito aparelho porque a maldita mensagem nunca vêm.

"A mon avis", quais são as melhores cenas de amor que já vi em filmes? Não sei porque, tenho uma preferência por amores em contradição. Não pelo lado belo do amor, mas pelo ridículo, pela estupidificação da razão... Platão, em "O Banquete", deixa o melhor para o final: depois que todos expõem suas idéias sobre a beleza do amor, Sócrates toma a palavra, e relata o que ouviu de Diotima (uma mulher sábia em Atenas?): o amor não é belo: é feio, sujo e mendicante. Mas busca o que é belo e sublime. E nessa busca, como ficamos frágeis... nus diante de nossas deficiências! Abaixo, algumas cenas memoráveis:

"Magnólia" (1999- EUA - Direção de Paul Thomas Anderson): esse filme não possui uma, mas várias cenas de amor memoráveis. O policial correto (foto ao lado - John C. Reilly como Jim Curring - se preparando para sair... repare no crucifixo que ele mantém em cima da cama) e a maluquete viciada em cocaína. Marcam um encontro quando ele vai até a casa dela, respondendo a uma denúncia de que ela havia ligado o som a um volume insuportável ( música de Aimee Mann - maravilhosa). No encontro, ela está com a cocaína saindo pelos poros, e nervosíssima. Afinal, aquele era o extermo oposto dos encontros aos quais ela estava acostumada. Os dois mantém um breve diálogo e ele fala: "vo
cê tem um vocábulário pesado!" Ela o beija de leve, e se desculpa por ser o tipo de pessoa com quem ele nunca deveria se envolver. No final do filme, depois da chuva de sapos (quem entender o porque daquela chuva me explique), ele a encontra, e diz que vai cuidar dela... no seu jeito meio pedagógico de policial correto.
Fico pensando naquelas pessoas que se deparam com essa situação: encontram alguém por quem julgam não merecer serem amadas. Mas mesmo por trás da máscara da pordridão (algumas pessoas usam máscaras que as mostram piores do que realmente são, ao contrário da maioria) há a possibilidade de alguém revolver o lix
o e ver o que há de belo (uma das crenças que mantenho no verdadeiro amor).
Ainda em "Magnólia": A mulher que casou por dinheiro com um ancião uns quarenta anos mais velho( imagem ao lado, J
ulianne More e Jason Robbarts, como Linda e Earl Partridge), confessa ao advogado que não quer herdar a fortuna do marido. "Eu fiz sexo oral com outros homens..." (confessa que foi uma vadia) "Meu marido está morrendo e agora eu descobri que o amo"! Atire a primeira pedra quem nunca descobriu que amava alguém só no momento da perda... há paixão mais arrebatadora, visceral do que aquela que se sente por alguém que vai partir?

"A festa de Babette" (Dinamarca, 1987 - direção de Gabriel Axel) - esse filme mostra um aspecto pouco comentado do erotismo, mas muito presente: se deliciar com um belo banquete pode ser uma ato erótico, uma explosão de prazer catártica. As personagens centrais são duas velhotas que cultuam a memória do pai, um pastor puritano de uns poucos adeptos. Levaram uma vida de austera simplicidade, e quando acolhem em sua casa uma cozinheira estrangeira que perdeu tudo o que tinha (bens e familiares), logo a integram ao seu sitema de vida, ensinando-a a cozinhar o estóico mingau de aveia que lhes serve de refeição todos os dias. Essas senhoras, nos áureos anos da juventude, foram amadas: uma pelo seu professor de canto e a outra por um gene
ral.
Babette, a cozinheira, recebe o dinheiro de uma herança pelo qual não esperava. Como um presente às senhoras que a acolheram manda vir, de lugares diversos, iguarias exóticas, com as quais vai cozinhar um banquete. Os ex-pretendentes das velhas senhoras estão convidados.
São de grande beleza as cenas em que mostram os convivas comendo. No final, um menino que limpa as mesas toma o restinho do vinho das taças. Detalhes que tornam um filme memorável.
A declaraçã
o de amor do general por sua antiga amada é comovente em sua simpl
icidade. Diz que durante toda a sua vida, enquanto ele sentava-se à mesa para fazer as refeições, era a ela que ele via, sentada, a sua frente. A fantasia de seu amor é a de um ato quotidiano: sentar-se juntos para as refeições.
A relação amor + gastronomia contida no filme nos faz lembrar que erotismo não é simplesmente coito, ato sexual, mas está presente em tudo aquilo que nos dá prazer. E viver o "eros" de forma realmente intensa quando descobrimos o prazer que se encontra em diversas atividade que nos despertam os sentidos e trazem à alma a sensação de plenitude.
Tamb
ém magnífica é a cena em que a velhinha tem pesadelos com as tartarugas e outros ingredientes misteriosos que serão usados no banquete. Será pecado comer com prazer? Pecado é tudo aquilo que desperta o prazer erótico. Veja os pecados capitais: um deles é a gula. Buscar um jantar perfeito pode influenciar na busca de um amor perfeito?

"Ata-me!" (Espanha, 1990 - Direção e roteiro de Pedro Almodovar) - Victoria Abril é a atriz
pornô Marina Osório. Antônio Banderas é Ricky, recém saído de uma instituição psiquiátrica, não sem antes satisfazer aos desejos da mais que balzaquiana psiquiatra que o atende (bem ao estilo Almodovar). Ricky mantém uma paixão intensa por Marina, ao ponto de invadir seu apartamento e a manter aprisionada. Marina não se recorda, mas em uma de suas aventuras noturnas em algum bar de quinta categoria, transou com Ricky no banheiro em troca de um baseado.
A solidão de Marina é demonstrada em uma cena cômica, na banheira, quando ela se diverte com um mer gulhador movido a pilhas, que nada "direto ao alvo". Enquanto Ricky Está em seu apartamento, a princípio, ela o repudia. Ele a mantém atada, mas não a obriga a ter relações com ele. Não demora muito para que o espectador veja que de duas almas perdidas pode surgir um belo encontro. Quando resolvem se entregar um ao outro, temos uma cena especialíssima, digna do diretor. Na cena que dá nome ao filme, Ricky sai para comprar drogas para sua amada. Pergunta a ela se não vai fugir enquanto ele estiver fora. Ela responde: "Yo no lo sé... Ata-me!". Inútil continuar a descrição...

Como dizia Camões sobre o amor "É querer estar preso por vontade". Nas paixões mais intensas há muito dessa louca submissão.

"O Primeiro Dia" (Brasil, 1999 - direção de Walter Salles e Daniela Thomas) - João (Luiz Carlos Vasconcellos) fugiu do presídio e matou seu melhor am
igo, Francisco (Matheus Nachtergale). Fernanda Torres é Maria, a jovem abandonada companheiro com quem vivia. Tudo isso ocorre no dia 31 de dezembro de 1999, próximo a tão festejada virada do milênio. João foge da perseguição policial, e vai se refugiar no terraço do prédio de onde Maria tensiona pular para a morte. No momento em que Maria vai pular, João a segura. Estouram os fogos de artifício na Praia de Copacabana. João e Maria se abraçam e dando tiros para o alto ele grita: "Ninguém mais morre nesta cidade! Ninguém mais morre neste país!" Filmado com orçamento baixíssimo, muitas cenas em tempo real (como a dos fogos de artifício), o filme é arrebatador, e a cena descrita é belíssima.
Na manhã seguinte, Maria nada no mar de Copacabana, e João fica na orla esperando enquanto a olh,a com um ar de encantamento que acredita-se que nunca mais teria lhe sido possível numa vida tão bruta. É morto, e a cena mostra uma pessoa qualquer dando-lhe o tiro pelas costas... não importa quem seja. Um desafeto qualquer, pois a vida que João levava já o deixara marcado. Acreditamos que a cena seguinte será Maria novamente tentando suicídio: mais uma vez está abandonada à própria sorte. Mas a sensibilidade dos diretores vai mais longe: ela volta ao apartamento, onde se desesperou diante do vazio deixado pelo companheiro e abre a janela, expondo-se a luz... na água, o batismo, na luz, a regeneração. O encontro de Maria com João não foi o início de um romance, mas a ressurreição de Maria.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Manifesto: Nós, os distraídos!

Distraídos de todo o mundo, uni-vos!

Nós os distraídos... tropeçamos no que está a nossa frente, porque olhamos mais ao infinito... nossos horizontes são mais largos...
Nós os distraídos temos grandes projetos que ocupam nossa mente, que fervilham nossas ideias... por isso esquecemos alguns compromissos imediatos: estamos em eterno devir...
Frequentemente perdemos as chaves de casa... mas abrimos muitas portas com nossas ideias geniais!
Perdemos pastas, documentos, dinheiro, celular... mas a felicidade não está justamente em se desapegar dos bens materiais?

Nós os distraídos sabemos do imenso valor de esquecimento. Somos também os grandes esquecidos da espécie humana! Pois temos consciência de que só se curam as dores da alma e do coração quando se pratica a maravilhosa arte do esquecimento. Nossas consciencias, meio adormecidas meio despertas tem poder de viajar por terras longínquas e se desligar tudo o que há de imediato.... não nos prendemos ao que é fugidio. Já diz a sabedoria dos orientais que tudo nessa vida é poeira ao vento: as paixões, as obrigações, as cismas. Por isso é que nós esquecemos, e assim mantemos a mente conectada com a Eternidade.

Nós os distraídos temos um imenso amor pela vida. Olhamos sempre ao alto, com olhos que parecem contemplar o vazio, mas escondem pensamentos em ebulição, que a nada se detém por muito tempo, mas a tudo transformam. Nosso mundo interior supera as mazelas desse frio mundo exterior. Somos donos de nossa própria realidade, e não aceitamos que o real nos seja dado como pronto: recriamos o mundo a cada segundo!

Nós os distraídos não queremos ser educados. Não queremos ser conformados!

Vocês, senhores corretos, que vivem a amargar o minuto seguinte, deixem nos viver imersos em nossa eternidade. Porque a vida é um breve momento, e depois dela só o que é eterno perdura!

domingo, 11 de maio de 2008

Absurdos da vida de professora #2 - revistinha pornô

Quem nunca se deparou com uma dessas revistinhas sacanas quando era adolescente? Sempre tem aquele seu colega que carrega uma dessas como um instrumento de poder e autoridade.
Lembro de uma ocasião em que uma colega, professora, recolheu uma dessas. Mas era daquelas bem cabeludas, de fazer corar até a Mae West. Quando a professora largou o objeto proibido em cima da mesa da sala dos professores, foi como se trouxesse os manuscritos originias da Bíblia. Gerou um tumulto geral em volta da resvita, um passa de mão em mão... olhos curiosos, exclamações de Ah! Oh! Teve até gente dizendo que ia levar pra casa, pra ver se o marido aprendia a fazer umas coisinhas diferentes...
Mas uma lembrança inesquecível foi de quando, naquele mesmo dia, mais tarde, fui até a sala da vice direção pedir alguma coisa... a porta estava entreaberta, fui chegando sem bater. E não é que a vice estava lá, sentadinha, concentrada na revistinha? O melhor de tudo foi a cara que ela fez quando me viu. Ficou toda sem jeito e já foi dando explicação: "Eu estava aqui olhando, os absurdos que esses alunos trazem pra aula, etc"...
(Claro, senhorita, eu entendo, isso é mera curiosidade antropológica)
(...)
São esses absurdos que fazem essa profissão valer a pena!

terça-feira, 6 de maio de 2008

EsoHisterismo: princípios


Um EsoHistérico, é mais do que um simples esotérico. Ele segue fielmente o páragrafo 195 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão: "Pelo direito de se achar". Para ser um bom EsoHistérico, você deve seguir os seguintes passos:

- Busque sempre uma corrente de pensamento religioso que justifique suas mancadas. Quando não encontrar nenhuma, leia Nietzche, está na moda... diga que você não partilha de uma "moral de escravos" e como "super homem" está acima do bem o do mal. Mas lembre-se: isso é só para quando você já ferrou com a vida de bastante gente. E quando você ver que Nietzche não cura dor-de-cotovelo nem serve para aqueles momentos em que você está batendo com a cabeça na parede de tão nervoso, enfie o rabo entre as pernas e procure uma cartomante (eu ofereço meus serviços).
-Prefira um visual excêntrico, que te destaque de todos os demais seres viventes. Muito preto ou muito colorido. Veja o efeito que você causa nas pessoas: se elas não estiverem te olhando, é porque você não tem as devidas qualidades mágicas, e as energias do astral não vão te favorecer. Um bom EsoHistérico é uma vítima do sistema. Você deve ser olhado de maneira estranha, assim poderá bater no peito e dizer que é evoluído demais para esse planeta, e que suas energias entram em conflito com as dos néscios! Uma boa alternativa é você usar um sobretudo preto num calor de 40 graus, com uma maquiagem escura que lhe escorre dos olhos e que desperte nas pessoas alguma lembrança de infância dos vilões de contos-de-fadas. Lembre-se, a fórmula é essa: se você é amado e compreendido, então é um néscio!
-Na vida, recebemos constantemente sinais. Aprenda a reconhecê-los! Se você acordar algum dia sem vontade de trabalhar e ver um cachorro preto na rua, volte para casa, e diga ao seu chefe que os Mestres Ascensionados lhe mandaram um sinal de que aquele dia seria de mau agouro. Ele certamente irá compreender;
- Mostre que você tem amor à natureza, e através dela se integra com o mundo espiritual. Derrube alguns hectares de mata atlântica para construir uma casa super transada no meio do morro, e não esqueça de asfaltar tudo para que seus amigos esohistéricos lhe visitem. Decore a casa com estátuas indianas feitas de madeira de árvores retiradas da Amazônia por madeireiras clandestinas.
- Largue maçãs e doces para os gnomos sempre que tiver uma dor-de-cotovelo ou se endividar com bebidas e orgias. Eles certamente trocarão maçãs por uma conta polpuda no banco e um parceiro dotado de beleza e riqueza. É claro, que pra completar a conta (os danadinhos são gananciosos), vão roubar alguns objetos metálicos, como facas e tesouras. Mas cuidado para prover os serezinhos sempre com suas guloseimas, ou esses objetos pontiagudos podem ser usados contra você.
- Tenha um obsessor de estimação. Mas não esqueça essa palavra: OBSESSOR. Por favor, não fale em encosto, porque quem tem encosto é chinelão. Seu obsessor pode ser um grande aliado, assumindo a culpa por coisas que você se arrepende de ter feito. Por exemplo: seu encosto é alcoolatra, foi ele quem tomou seu corpo quando você encheu a cara e queimou o filme (um longa metragem do tamanho de Casablanca), brigando com todo o mundo e acordando no dia seguinte com um corpo estranho na cama, num quarto do Motel Venus (sem acento mesmo), ou quanto foi encontrado na sarjeta bem na frente do seu novo emprego.
- Descubra qual foi sua última reencarnação. Ou melhor: escolha. Porque talvez você descubra que foi um limpador de bosta de camelo em Djarabub, e isso não é informação que se divulgue. Lembre-se de encontrar alguém famoso, mas descarte algumas opções, que já reencarnaram tantas vezes que devem ter uma alma do tamanho do Maracanã. A Associação Internacional de Psicoenergética Imaterial Metafísica (AIPIM) possui dados sobre isso: vagando sobre a terra, expiando seus pecados passados numa vida de glória, há 23.897 reencarnações de Napoleão, 21.789 reencarnações de Cleópatra, 16.523 de Touro Sentado, 12.456 de Adolf Hitler, e mais umas tantas de Churchill, Lincoln, Gandhi e alguns outros figurões. Dom Pedro I também já tem um novo corpo: Fernando Collor de Mello se declarou ser sua reencarnação, e explica que o Impeachment é um karma antigo. Alguns nomes entraram na moda recentemente, como Edith Piaf e Jim Morrisson: você pode patentear seu direito de reencarnado antes que seja tarde. Garanta também o futuro de seus filhos: tem uns desencarnados quentinhos, saídos do forno, esperando por novos corpos, como George Harrisson e Joey Ramone. Você também pode esperar mais alguns anos por Fidel Castro, mas se for mulher, é perigoso que entre na menopausa antes que o velho decida finalmente partir. Dizem que há um séquito de fãs esperando que Amy Whinehouse finalmente tome uma overdose, assim poderá reencarnar nos seus pimpolhos.
- Fique rico! Crescer espiritualmente pode ser uma forma excelente de se atingir bens materias. Perdoe sua mãe, seu pai, sues ex-conjuges, desafetos (com excessão dos seus credores) e espere recompensas do céu como carro, um iate, uma mansão... esqueça aquele discurso de desapego aos bens materiais. Fique rico, exiba um belo sorriso, encha sua casa de bugigangas esotéricas e compre muitas roupas importadas da India e do Nepal.

Absurdos da vida de professora

Há um tempo atrás, estava lecionando a noite, para uma turma de umas seis almas viventes... nesse caso, como é de praxe, a gente aproveita pra bater um papo com aqueles poucos heróis que enfrentaram a chuva, o frio, ou deixaram de ir no show do "Tchê Garotos" pra assitir nossa aula. Não dá para passar revisão de prova, nem iniciar matéria nova, nem atividade alguma que tenha qualquer finalidade atrelada aos sagrados "conteúdos"...
Pois bem, tentávamos não dormir. Não sabíamos sobre o que conversar. Um dos meus queridos pupilos achou legal mostrar os toques do seu celular, mas foi fulminado com um olhar que deverá lhe trazer algum dano cerebral daqui a alguns anos...
Alguém teve a idéia de me pedir que eu contasse alguma história engraçada ou ridícula dos anos em que dei aula. Lembrei dessa:

Eu dava aula em uma escola que ficava cravada no meio de um parque. Árvores, vaquinhas pastando... no pátio da escola! Não tinha muro que marcasse os limites entre o parque e o colégio, e recebíamos a visita de todas as espécies animais que transitavam pelo local.
Naquele dia, eu estava em uma sexta série. Eu era uma jovem professora comprometida com o desenvolvimento intelectual e humanos de meus alunos. Eles, serezinhos que pipocavam hormônios e eram fruto de todas as mazelas sociais já classificadas pelo vade-mecum da psicologia e da psicopedagogia, no pleno frescor dos doze ou treze anos. Não lembro bem como rebelião começou... acho que foi assim: eu pergunti a eles quem viria buscar livros comigo. Num gesto de grande euforia participativa, todos começaram a pular ao mesmo tempo e gritar: eu! eu! eu! Logo, estavam saindo pela porta feito uma boaiada ensandecida. Um deles se atirou no chão e começou a gritar: "Comida de Exu! Comida de Exu!" Era o "batuqueiro" do cólégio, que costumava dançar em cima da mesa dizendo que estava possuído pela Pomba Gira. Homossexual, gordo, negro, pobre e "macumbeiro": não preciso dizer que era alvo de todos os preconceitos possíveis.
Um outro, achando aquilo bonito, se atirou também ao chão e começou a imitá-lo.
Daqui a pouco, um grito de protesto: "O Juliano (nome fictício) tá enfiando o pau no cu da vaca!!! Professora, faz alguma coisa!!!" A pestinha ensaiava enfiar um cabo de vassoura na retaguarda de uma vaquinha que pastava calmamente do lado da sala de aula...
Não lembro como terminou... deve ter sido um daqueles dias em que volto pra casa com a sensação de que fui atacada por uma turba de obsessores...