Falar em filmes românticos... ou não tão românticos assim. Afinal, as paixões não se fazem só de beijos magnifícos e reconciliações... há a dor, o ridículo, o absurdo.
O amor romântico é para os fracos... mas ainda quero conhecer alguém suficientemente forte pra se safar dessa pieguice. Afinal de contas, o que há de comum entre o doutor em Astrofísica e o mané da padaria? Ambos já pensaram em cortar os pulsos no frenesi de uma jura de amor rompida ou dizer para alguma mulher: "sua desgraçada"! O que há de comum entre uma mulher superexperiente pós graduada em relacionamentos e com vida profissional de sucesso e uma ninfeta de 12 anos que bate o o pé para ir à escola? Ambas ficam eufóricas quando recebem uma mensagem de seu pretendente no celular, ou não desgrudam do maldito aparelho porque a maldita mensagem nunca vêm.
"A mon avis", quais são as melhores cenas de amor que já vi em filmes? Não sei porque, tenho uma preferência por amores em contradição. Não pelo lado belo do amor, mas pelo ridículo, pela estupidificação da razão... Platão, em "O Banquete", deixa o melhor para o final: depois que todos expõem suas idéias sobre a beleza do amor, Sócrates toma a palavra, e relata o que ouviu de Diotima (uma mulher sábia em Atenas?): o amor não é belo: é feio, sujo e mendicante. Mas busca o que é belo e sublime. E nessa busca, como ficamos frágeis... nus diante de nossas deficiências! Abaixo, algumas cenas memoráveis:
"Magnólia" (1999- EUA - Direção de Paul Thomas Anderson): esse filme não possui uma, mas várias cenas de amor memoráveis. O policial correto (foto ao lado - John C. Reilly como Jim Curring - se preparando para sair... repare no crucifixo que ele mantém em cima da cama) e a maluquete viciada em cocaína. Marcam um encontro quando ele vai até a casa dela, respondendo a uma denúncia de que ela havia ligado o som a um volume insuportável ( música de Aimee Mann - maravilhosa). No encontro, e
la está com a cocaína saindo pelos poros, e nervosíssima. Afinal, aquele era o extermo oposto dos encontros aos quais ela estava acostumada. Os dois mantém um breve diálogo e ele fala: "você tem um vocábulário pesado!" Ela o beija de leve, e se desculpa por ser o tipo de pessoa com quem ele nunca deveria se envolver. No final do filme, depois da chuva de sapos (quem entender o porque daquela chuva me explique), ele a encontra, e diz que vai cuidar dela... no seu jeito meio pedagógico de policial correto.
Fico pensando naquelas pessoas que se deparam com essa situação: encontram alguém por quem julgam não merecer serem amadas. Mas mesmo por trás da máscara da pordridão (algumas pessoas usam máscaras que as mostram piores do que realmente são, ao contrário da maioria) há a possibilidade de alguém revolver o lixo e ver o que há de belo
(uma das crenças que mantenho no verdadeiro amor).
Ainda em "Magnólia": A mulher que casou por dinheiro com um ancião uns quarenta anos mais velho( imagem ao lado, Julianne More e Jason Robbarts, como Linda e Earl Partridge), confessa ao advogado que não quer herdar a fortuna do marido. "Eu fiz sexo oral com outros homens..." (confessa que foi uma vadia) "Meu marido está morrendo e agora eu descobri que o amo"! Atire a primeira pedra quem nunca descobriu que amava alguém só no momento da perda... há paixão mais arrebatadora, visceral do que aquela que se sente por alguém que vai partir?
"A festa de Babette" (Dinamarca, 1987 - direção de Gabriel Axel) - esse filme mostra um aspecto pouco comentado do erotismo, mas muito presente: se deliciar com um belo banquete pode ser uma ato erótico, uma explosão de prazer catártica. As personagens centrais são duas velhotas que cultuam a memória do pai, um pastor puritano de uns poucos adeptos. Levaram uma vida de austera simplicidade, e quando acolhem em sua casa uma cozinheira estrangeira que perdeu tudo o que tinha (bens e familiares), logo a integram ao seu sitema de vida, ensinando-a a cozinhar o estóico mingau de aveia que lhes serve de refeição todos os dias. Essas senhoras, nos áureos
anos da juventude, foram amadas: uma pelo seu professor de canto e a outra por um general.
Babette, a cozinheira, recebe o dinheiro de uma herança pelo qual não esperava. Como um presente às senhoras que a acolheram manda vir, de lugares diversos, iguarias exóticas, com as quais vai cozinhar um banquete. Os ex-pretendentes das velhas senhoras estão convidados.
São de grande beleza as cenas em que mostram os convivas comendo. No final, um menino que limpa as mesas toma o restinho do vinho das taças. Detalhes que tornam um filme memorável.
A declaração de amor do general por sua antiga amada é comovente em sua simplicidade. Diz que durante toda a sua vida, enquanto ele sentava-se à mesa para fazer as refeições, era a ela que ele via, sentada, a sua frente. A fantasia de seu amor é a de um ato quotidiano: sentar-se juntos para as refeições.
A relação amor + gastronomia contida no filme nos faz lembrar que erotismo não é simplesmente coito, ato sexual, mas está presente em tudo aquilo que nos dá prazer. E viver o "eros" de forma realmente intensa quando descobrimos o prazer que se encontra em diversas atividade que nos despertam os sentidos e trazem à alma a sensação de plenitude.
Também magnífica é a cena em que a velhinha tem pesadelos com as tartarugas e outros ingredientes misteriosos que serão usados no banquete. Será pecado comer com prazer? Pecado é tudo aquilo que desperta o prazer erótico. Veja os pecados capitais: um deles é a gula. Buscar um jantar perfeito pode influenciar na busca de um amor perfeito?
"Ata-me!" (Espanha, 1990 - Direção e roteiro de Pedro Almodovar) - Victoria Abril é a atriz pornô Marina Osório. Antônio Banderas é Ricky, recém saído de uma instituição psiquiátr
ica, não sem antes satisfazer aos desejos da mais que balzaquiana psiquiatra que o atende (bem ao estilo Almodovar). Ricky mantém uma paixão intensa por Marina, ao ponto de invadir seu apartamento e a manter aprisionada. Marina não se recorda, mas em uma de suas aventuras noturnas em algum bar de quinta categoria, transou com Ricky no banheiro em troca de um baseado.
A solidão de Marina é demonstrada em uma cena cômica, na banheira, quando ela se diverte com um mer gulhador movido a pilhas, que nada "direto ao alvo". Enquanto Ricky Está em seu apartamento, a princípio, ela o repudia. Ele a mantém atada, mas não a obriga a ter relações com ele. Não demora muito para que o espectador veja que de duas almas perdidas pode surgir um belo encontro. Quando resolvem se entregar um ao outro, temos uma cena especialíssima, digna do diretor. Na cena que dá nome ao filme, Ricky sai para comprar drogas para sua amada. Pergunta a ela se não vai fugir enquanto ele estiver fora. Ela responde: "Yo no lo sé... Ata-me!". Inútil continuar a descrição...
Como dizia Camões sobre o amor "É querer estar preso por vontade". Nas paixões mais intensas há muito dessa louca submissão.
"O Primeiro Dia" (Brasil, 1999 - direção de Walter Salles e Daniela Thomas) - João (Luiz Carlos Vasconcellos) fugiu do presídio e matou seu melhor am
igo, Francisco (Matheus Nachtergale). Fernanda Torres é Maria, a jovem abandonada companheiro com quem vivia. Tudo isso ocorre no dia 31 de dezembro de 1999, próximo a tão festejada virada do milênio. João foge da perseguição policial, e vai se refugiar no terraço do prédio de onde Maria tensiona pular para a morte. No momento em que Maria vai pular, João a segura. Estouram os fogos de artifício na Praia de Copacabana. João e Maria se abraçam e dando tiros para o alto ele grita: "Ninguém mais morre nesta cidade! Ninguém mais morre neste país!" Filmado com orçamento baixíssimo, muitas cenas em tempo real (como a dos fogos de artifício), o filme é arrebatador, e a cena descrita é belíssima.
Na manhã seguinte, Maria nada no mar de Copacabana, e João fica na orla esperando enquanto a olh,a com um ar de encantamento que acredita-se que nunca mais teria lhe sido possível numa vida tão bruta. É morto, e a cena mostra uma pessoa qualquer dando-lhe o tiro pelas costas... não importa quem seja. Um desafeto qualquer, pois a vida que João levava já o deixara marcado. Acreditamos que a cena seguinte será Maria novamente tentando suicídio: mais uma vez está abandonada à própria sorte. Mas a sensibilidade dos diretores vai mais longe: ela volta ao apartamento, onde se desesperou diante do vazio deixado pelo companheiro e abre a janela, expondo-se a luz... na água, o batismo, na luz, a regeneração. O encontro de Maria com João não foi o início de um romance, mas a ressurreição de Maria.
O amor romântico é para os fracos... mas ainda quero conhecer alguém suficientemente forte pra se safar dessa pieguice. Afinal de contas, o que há de comum entre o doutor em Astrofísica e o mané da padaria? Ambos já pensaram em cortar os pulsos no frenesi de uma jura de amor rompida ou dizer para alguma mulher: "sua desgraçada"! O que há de comum entre uma mulher superexperiente pós graduada em relacionamentos e com vida profissional de sucesso e uma ninfeta de 12 anos que bate o o pé para ir à escola? Ambas ficam eufóricas quando recebem uma mensagem de seu pretendente no celular, ou não desgrudam do maldito aparelho porque a maldita mensagem nunca vêm.
"A mon avis", quais são as melhores cenas de amor que já vi em filmes? Não sei porque, tenho uma preferência por amores em contradição. Não pelo lado belo do amor, mas pelo ridículo, pela estupidificação da razão... Platão, em "O Banquete", deixa o melhor para o final: depois que todos expõem suas idéias sobre a beleza do amor, Sócrates toma a palavra, e relata o que ouviu de Diotima (uma mulher sábia em Atenas?): o amor não é belo: é feio, sujo e mendicante. Mas busca o que é belo e sublime. E nessa busca, como ficamos frágeis... nus diante de nossas deficiências! Abaixo, algumas cenas memoráveis:
"Magnólia" (1999- EUA - Direção de Paul Thomas Anderson): esse filme não possui uma, mas várias cenas de amor memoráveis. O policial correto (foto ao lado - John C. Reilly como Jim Curring - se preparando para sair... repare no crucifixo que ele mantém em cima da cama) e a maluquete viciada em cocaína. Marcam um encontro quando ele vai até a casa dela, respondendo a uma denúncia de que ela havia ligado o som a um volume insuportável ( música de Aimee Mann - maravilhosa). No encontro, e

Fico pensando naquelas pessoas que se deparam com essa situação: encontram alguém por quem julgam não merecer serem amadas. Mas mesmo por trás da máscara da pordridão (algumas pessoas usam máscaras que as mostram piores do que realmente são, ao contrário da maioria) há a possibilidade de alguém revolver o lixo e ver o que há de belo

Ainda em "Magnólia": A mulher que casou por dinheiro com um ancião uns quarenta anos mais velho( imagem ao lado, Julianne More e Jason Robbarts, como Linda e Earl Partridge), confessa ao advogado que não quer herdar a fortuna do marido. "Eu fiz sexo oral com outros homens..." (confessa que foi uma vadia) "Meu marido está morrendo e agora eu descobri que o amo"! Atire a primeira pedra quem nunca descobriu que amava alguém só no momento da perda... há paixão mais arrebatadora, visceral do que aquela que se sente por alguém que vai partir?
"A festa de Babette" (Dinamarca, 1987 - direção de Gabriel Axel) - esse filme mostra um aspecto pouco comentado do erotismo, mas muito presente: se deliciar com um belo banquete pode ser uma ato erótico, uma explosão de prazer catártica. As personagens centrais são duas velhotas que cultuam a memória do pai, um pastor puritano de uns poucos adeptos. Levaram uma vida de austera simplicidade, e quando acolhem em sua casa uma cozinheira estrangeira que perdeu tudo o que tinha (bens e familiares), logo a integram ao seu sitema de vida, ensinando-a a cozinhar o estóico mingau de aveia que lhes serve de refeição todos os dias. Essas senhoras, nos áureos

Babette, a cozinheira, recebe o dinheiro de uma herança pelo qual não esperava. Como um presente às senhoras que a acolheram manda vir, de lugares diversos, iguarias exóticas, com as quais vai cozinhar um banquete. Os ex-pretendentes das velhas senhoras estão convidados.
São de grande beleza as cenas em que mostram os convivas comendo. No final, um menino que limpa as mesas toma o restinho do vinho das taças. Detalhes que tornam um filme memorável.
A declaração de amor do general por sua antiga amada é comovente em sua simplicidade. Diz que durante toda a sua vida, enquanto ele sentava-se à mesa para fazer as refeições, era a ela que ele via, sentada, a sua frente. A fantasia de seu amor é a de um ato quotidiano: sentar-se juntos para as refeições.
A relação amor + gastronomia contida no filme nos faz lembrar que erotismo não é simplesmente coito, ato sexual, mas está presente em tudo aquilo que nos dá prazer. E viver o "eros" de forma realmente intensa quando descobrimos o prazer que se encontra em diversas atividade que nos despertam os sentidos e trazem à alma a sensação de plenitude.
Também magnífica é a cena em que a velhinha tem pesadelos com as tartarugas e outros ingredientes misteriosos que serão usados no banquete. Será pecado comer com prazer? Pecado é tudo aquilo que desperta o prazer erótico. Veja os pecados capitais: um deles é a gula. Buscar um jantar perfeito pode influenciar na busca de um amor perfeito?
"Ata-me!" (Espanha, 1990 - Direção e roteiro de Pedro Almodovar) - Victoria Abril é a atriz pornô Marina Osório. Antônio Banderas é Ricky, recém saído de uma instituição psiquiátr

A solidão de Marina é demonstrada em uma cena cômica, na banheira, quando ela se diverte com um mer gulhador movido a pilhas, que nada "direto ao alvo". Enquanto Ricky Está em seu apartamento, a princípio, ela o repudia. Ele a mantém atada, mas não a obriga a ter relações com ele. Não demora muito para que o espectador veja que de duas almas perdidas pode surgir um belo encontro. Quando resolvem se entregar um ao outro, temos uma cena especialíssima, digna do diretor. Na cena que dá nome ao filme, Ricky sai para comprar drogas para sua amada. Pergunta a ela se não vai fugir enquanto ele estiver fora. Ela responde: "Yo no lo sé... Ata-me!". Inútil continuar a descrição...
Como dizia Camões sobre o amor "É querer estar preso por vontade". Nas paixões mais intensas há muito dessa louca submissão.
"O Primeiro Dia" (Brasil, 1999 - direção de Walter Salles e Daniela Thomas) - João (Luiz Carlos Vasconcellos) fugiu do presídio e matou seu melhor am

Na manhã seguinte, Maria nada no mar de Copacabana, e João fica na orla esperando enquanto a olh,a com um ar de encantamento que acredita-se que nunca mais teria lhe sido possível numa vida tão bruta. É morto, e a cena mostra uma pessoa qualquer dando-lhe o tiro pelas costas... não importa quem seja. Um desafeto qualquer, pois a vida que João levava já o deixara marcado. Acreditamos que a cena seguinte será Maria novamente tentando suicídio: mais uma vez está abandonada à própria sorte. Mas a sensibilidade dos diretores vai mais longe: ela volta ao apartamento, onde se desesperou diante do vazio deixado pelo companheiro e abre a janela, expondo-se a luz... na água, o batismo, na luz, a regeneração. O encontro de Maria com João não foi o início de um romance, mas a ressurreição de Maria.